Dr. Salomão Kahwage
É frequente ouvir falar de um amigo ou conhecido que, repentinamente, descobriu uma doença grave (geralmente câncer), ou que foi acometido de um infarto. Fatos dessa ordem costumam causar muita surpresa, sobretudo quando esses imprevistos de desordem da saúde ocorrem em indivíduos que aparentemente se mostravam saudáveis.
Pode-se assinalar que, das três principais causas de morte, pela ordem, destacam-se as cardiovasculares (infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral), o câncer e o trauma. Destas, a única que surge de forma imprevista é o trauma. Nas demais, costuma haver uma mostra de sinalização, antes mesmo que a pessoa apresente qualquer sintoma capaz de indicar que algo grave está para acontecer. Nessa etapa inicial, as medidas preventivas alcançam os melhores resultados. Por isso, é fundamental a realização de uma avaliação regular, conhecida como check-up. As doenças em geral só produzem sintomas depois de algum tempo de instaladas no organismo. A procura do médico, apenas quando ocorre sintomas, torna o tratamento mais difícil, mais oneroso e de resultados menos efetivos.
A determinação da idade ideal para iniciar um exame médico periódico (check-up) depende de uma série de informações sobre a saúde do indivíduo, incluídas aí a história familiar e seus hábitos de vida. Por exemplo, as doenças de origem genética podem ter início mais cedo (diabetes, colesterol elevado, doença renal policística). O mesmo acontece com o tabagismo e a obesidade, que podem desencadear enfermidades precoces.
A periodicidade das avaliações depende da idade e do que foi detectado no primeiro atendimento médico realizado. De um modo geral, considerando pessoas que não tenham nenhuma doença, uma primeira consulta a um médico clínico é recomendável a partir dos 30 – 35anos de idade, quando, então, será determinada a periodicidade para aquela situação individual.
Como em todas as áreas da medicina, a definição de como será feita a avaliação médica periódica, e que exames deverão ser solicitados para rastreamentos, dependerá de critérios médicos e das melhores evidências científicas disponíveis. Existem instituições que se dedicam a avaliar essas evidências e elaborar recomendações.
rastreios baseados em evidência. As principais organizações que operam nessa área são a Canadian Task Force on Preventive Health Care e a U.S. Preventive Services Task Force. Ambas têm sites na internet dispostos à consulta livre. É claro que a definição do que deve ser feito em uma avaliação médica periódica restringe-se à individualidade, pois leva-se em conta sexo, idade, ocupação, hábitos e antecedentes de cada paciente.
Um aspecto fundamental da avaliação médica periódica é que ela deve estar estreitamente ligada a práticas de promoção da saúde. Só existe sentido no check-up se o seu principal componente for uma investigação cuidadosa de hábitos, estilo de vida e fatores de risco. E mais, se essa avaliação resultar na discussão cuidadosa, com cada paciente, das alternativas disponíveis e aproveitáveis para o alcance de uma vida mais saudável. Este é o impacto principal do check-up, e ele é muito maior do que o efeito potencial de todos os exames que forem solicitados. O benefício que um tabagista terá se o médico consolidar a sua perspectiva de que ele parou de fumar supera, em muito, os benefícios eventuais de todos os exames que forem solicitados.
O rastreamento deve ser considerado em uma perspectiva mais ampla, que não se reduz aos exames subsidiários. Existem doenças e problemas que devem ser investigados principalmente durante a anamnese (por exemplo hábitos alimentares, tabagismo, atividade física, sono, abuso de álcool, sexo seguro, depressão), durante o exame clínico (por exemplo hipertensão arterial, obesidade) e nos exames subsidiários
No que concerne ao câncer, só há consenso entre as principais entidades médicas em relação à necessidade de rastreamento para três tipos: câncer de colo uterino, câncer de mama e câncer colorretal (colonoscopia ou pesquisa de sangue oculto ≥ 50 anos). Câncer de próstata (toque + PSA) ≥ 50 anos (≥ 45 se risco aumentado – negros, história familiar).
Uma ultrassonografia aorta abdominal é indicada para pesquisa de aneurismas para homens 65-75 anos, ex-tabagistas. A densitometria óssea é indicada para todas as mulheres a partir dos 60 anos ou com fatores de risco clínicos (ex.: uso de glicocorticoides, baixo peso corporal, fratura prévia, consumo excessivo de álcool ou tabagismo) e para homens é indicada a partir dos 70 anos é recomendada.
O problema da solicitação de grande número de exames para rastreamento, em muitos programas de check-up, não é apenas o gasto desnecessário de recursos. Check-up pode fazer mal e muito mal. Existem riscos associados ao rastreamento, e essa idéia é, às vezes, difícil de aceitar porque sempre há o exemplo daquela pessoa que descobriu que tinha uma doença rara e foi tratada imediatamente, quando fez vários exames solicitados durante uma avaliação médica periódica. Um dos principais problemas são os pacientes que têm o teste positivo, mas não apresentam a doença (resultado falso-positivo). Nesses pacientes, a presença da doença será, muitas vezes, investigada com exames mais caros e mais invasivos, implicando em riscos. Muitos pacientes que têm o resultado falso-positivo podem ser considerados doentes, recebendo tratamento desnecessário e tendo repercussões psicológicas importantes. Por outro lado, resultados de exames que afastam a presença das doenças rastreadas, se não forem acompanhados de uma abordagem de promoção de saúde, podem dar uma falsa segurança de que não há necessidade de qualquer cuidado com a saúde, sendo um passaporte até o próximo check up.
A atualização do calendário vacinal para adultos saudáveis deve ser realizada: Influenza: anual; dT/dTpa: a cada 10 anos; Hepatite B: esquema completo se não vacinado. Hepatite A; Herpes zoster: ≥ 50 anos (Shingrix®); HPV (até 45 anos), se não vacinado antes; COVID-19: conforme orientações atualizadas